Resultado como condição “sine qua non” do crime

Discorremos sobre o instituto do resultado no ordenamento jurídico penal pátrio, apontando suas classificações e a relevância de sua aplicação pelo operador do direito sob a égide da Constituição Cidadã, de 05 de outubro de 1988, atentando-se aos fundamentos da dignidade da pessoa humana e ao estado democrático de direito


Na praxe jurídica, resultado é sinônimo de evento. Por sua vez, Ricardo Antonio Andreucci e outros autores, sustentam que evento é qualquer resultado, independentemente da conduta de alguém (ex.: incêndio provocado por um raio). Enquanto resultado é a consequência de uma conduta humana (ex.: morte por disparo de arma de fogo efetuado por alguém).

Seu fundamento jurídico, repousa no artigo 13, 1ª parte do Código Penal Brasileiro, que dispõe que: “o resultado de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa.”

Não se confunde com a consumação, prevista no artigo 14, caput, inciso I, do Codex, onde reza: “ diz-se o crime consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal.” Trata-se do último elemento do “Iter Criminis” (Itinerário do Crime), antecedido pela idealização, deliberação, resolução, cogitação, atos preparatórios e atos executórios.

Há duas teorias empregadas no instituto do resultado: a Naturalística relaciona-se ao resultado de ordem física ou material e a Jurídica ao resultado que acarreta dano ou ameaça de lesão a um interesse protegido pela norma penal.

Na esteira do conceito analítico de crime, seja bipartido (fato típico + antijurídico e a culpabilidade é pressuposto de aplicação de pena – finalismo no Brasil) ou tripartido (fato típico + antijurídico + culpabilidade – finalismo ou causalismo), o resultado está alojado no fato típico nos crimes materiais (corrente majoritária). Primeiro vem a conduta, segundo o resultado, terceiro o nexo causal e quarto a tipicidade. Juntamente com a conduta subsume-se à tipicidade por meio do nexo causal.

Todavia, há entendimento diverso, de que todo resultado necessita da aferição do nexo de causalidade e não somente os delitos que prevêem resultados naturalísticos, conforme leciona Luiz Flávio Gomes. (apud Salim; Azevedo, 2014)

Naturalística (Objeto Material ou Materialidade)

Segundo a teoria naturalística, resultado é a modificação no mundo exterior causada pela conduta. Essa modificação pode ser de ordem física (ex.: destruição de um objeto – art. 163 do CP), fisiológica (ex.: lesão corporal – art. 129 do CP) ou psicológica (ex.: percepção da ofensa – art. 140 do CP). Com esse conceito, pode-se dizer que nem todo crime possui resultado naturalístico, como ocorre com os crimes de mera conduta (ex: violação de domicílio; desobediência) e nos crimes formais (ex.: extorsão mediante seqüestro).

– crime material ou simétrico ou congruente: o tipo descreve uma conduta e o resultado naturalístico e exige para sua consumação a produção desse resultado. Exemplo: no art. 121 do CP, o tipo exige como resultado naturalístico a morte da vítima.

– crime formal ou de consumação antecipada ou de evento naturalístico cortado ou transcendental (especial finalidade) ou assimétrico ou incongruente: o tipo descreve uma conduta e o resultado naturalístico, mas não exige a realização desse resultado. Exemplo: extorsão mediante seqüestro (art. 159 do CP). O tipo descreve a conduta (seqüestro) e um resultado naturalístico externo à conduta (recebimento de qualquer vantagem como condição ou preço do resgate), mas não exige para a consumação que esse resultado se produza e, caso ocorra será levado em consideração pelo juiz na dosimetria da pena, nos termos do artigo 59 do CP.

– crime de mera conduta ou de simples atividade: o tipo descreve apenas uma conduta, sem mencionar qualquer resultado naturalístico. Não exige para a sua consumação um resultado naturalístico externo à ação. Exemplo: violação de domicílio (art. 150 do CP) e omissão de socorro (art. 135 do CP).

Observação:

– Alguns autores não fazem distinção entre os crimes formais e de mera conduta. São tipos penais que se realizam com a prática da conduta.

– Súmula 500 do STJ: “A configuração do crime previsto no artigo 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal.”

Normativa (Objetividade Jurídica ou Objeto Jurídico)

Em conformidade com essa teoria, resultado é a lesão (dano) ou ameaça (perigo) de lesão a um interesse (ou bem jurídico) protegido (tutelado) pela norma penal. Com esta concepção, todo crime possui resultado (resultado normativo ou jurídico). Atualmente, esta concepção de resultado vem sendo analisada no campo da tipicidade em seu aspecto material (desvalor do resultado), i. E., o resultado é aferido pela ofensividade ou lesividade que a conduta apresenta (concretamente, materialmente, efetivamente ou relevantemente) a um bem jurídico e se a conduta não causar lesão ou ameaça de lesão, haverá irrelevância (insignificância) jurídica do resultado, e, sem resultado jurídico, o fato será atípico. Por essa razão, os denominados delitos de bagatela, também chamados delitos mínimos ou de lesão mínima, em razão da ausência de resultado juridicamente relevante, acarretam a atipicidade penal.

Exemplo: no crime de homicídio (art. 121 do CP), o resultado naturalístico é a morte de uma pessoa, ao passo que o resultado normativo é a lesão ao bem jurídico vida. No crime de violação de domicílio (art. 150 do CP), não existe resultado naturalístico, mas sim resultado normativo, que é a lesão ao bem jurídico inviolabilidade domiciliar e à privacidade do morador.

De acordo com a teoria jurídica ou normativa, os crimes podem ser de dano (ou de lesão) ou de perigo.

Crimes de dano ou de lesão – são aqueles que se aperfeiçoam com a efetiva lesão do bem jurídico, alterando o mundo fenomênico (exemplos: homicídio, lesão corporal); a ausência da lesão (dano ou resultado naturalístico) pode configurar tentativa ou um indiferente penal.

Crimes de Perigo – são aqueles que se aperfeiçoam com a ocorrência da mera probabilidade de dano, ou seja, a consumação se dá com a simples criação do perigo. Este, pode ser concreto – precisa ser comprovado, p. Ex., no crime do art. 132 do CP e art. 309 do Código de Trânsito Brasileiro – e abstrato, ou seja, presumido, quando não necessita demonstração, como ocorre, por exemplo, nos crimes do art. 130 do CP, art. 33 da Lei de Drogas – Lei 11.343/2006 e art. 14 da Estatuto do Desarmamento – Lei 10.826/2003.

Em virtude dos aspectos mencionados, extraímos uma conclusão de que, é desnecessário a discussão acerca da aplicação distinta das duas teorias, pois entendemos que ambas se interrelacionam, conforme se depreende da Teoria do Resultado adotada no instituto da competência processual pelo lugar da infração, no artigo 70, 1ª parte, do Código Processual Penal (“a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração…”) e no instituto da prescrição penal como causa de extinção da punibilidade, prevendo no artigo 111, inciso I, do Código Penal (“A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr do dia em que o crime se consumou”).

No mesmo raciocínio, dispõe o artigo 13, 1ª parte, da Norma Repressiva de que para a existência do crime é necessário o resultado, ou seja, quando ocorre a consumação de qualquer modalidade de crime, implicitamente, está contido o resultado como pressuposto lógico.

Destarte, o texto legal, quando cita a consumação iguala ao resultado, seja este, material ou jurídico, haja vista, que todo o crime quando se consuma acarreta um dano ou potencialidade de lesão a um bem jurídico penalmente tutelado e consequentemente produz um resultado como causa do crime.


Referência Bibliográfica:

Vade Mecum Acadêmico de Direito Rideel / Anne Joyce Angher, organização. – 16. Ed.- São Paulo: Rideel, 2013. (Série Vade Mecum)

Souza, Luiz Antonio de. Direito Penal: Coleção OAB Nacional.4ª ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2011

Andrecci, Ricardo Antonio. Manual de direito penal / Ricardo Antonio Andreucci. 10. Ed. Rev. E atual. – São Paulo: Saraiva, 2014. 1. Direito penal. Título

Salim, Alexandre; Azevedo; Marcelo. Direito Penal: Coleção OAB. 2ª ed. Rev. E atual. – Salvador – Bahia: Ed. Jus Podivm, 2014

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